10/10/2018

Ataques, ameaças, justiceiros e mílicias: Ligando os pontos do Bolsonarismo

Menos de 24 horas após o encerramento do 1º turno das eleições de 2018, na madrugada de segunda-feira, dia 8, o mestre de capoeira conhecido como Moa do Katendê foi assassinado a facadas num bar em Salvador, na Bahia. O criminoso, um barbeiro de 36 anos, havia ingerido bebidas alcoólicas desde a manhã de domingo e chegou ao bar às 23h, segundo a polícia. Ele confessou que o motivo do crime foi político. Ele e Moa discutiram por causa da eleição. Ele apoiava o candidato Jair Bolsonaro (PSL) e Moa, Fernando Haddad (PT).

Esse não é o primeiro e está longe de ser o último caso de violência associada aos seguidores do candidato do PSL. Os casos se acumulam. Antes da eleição, eles resolveram atacar, nas redes, a jornalista que escreveu uma matéria crítica a ele. Porém, acabaram atacando outra jornalista, com o mesmo nome, que teve seus dados pessoais divulgados na Internet e sofreu diversas ameaças. No sábado antes da eleição, Julyanna Barbosa, mulher trans, ex-vocalista do grupo Furacão 2000, foi atacada com uma barra de ferro nas ruas do Rio de Janeiro. Os agressores disseram, antes de atacá-la, que "Bolsonaro vai ganhar pra acabar com os veados. Essa gente lixo tem que morrer". No domingo, um jornalista que usava uma camiseta com a imagem do ex-Presidente Lula foi atropelado por um motorista que depois ameaçou atirar, pois tinha uma arma. No perfil do motorista no Facebook, diversas postagens de ódio ao Partido dos Trabalhadores.

Ameaça que eu recebi no Facebook. Preciso dizer que candidato ele defendia?
Numa carreata pró-Bolsonaro na cidade de Muniz Ferreira, interior da Bahia, um cachorro foi morto a tiros por um dos manifestantes. Segundo a família, quando o cachorro, chamado de Marley, começou a latir para a carreata, o homem desceu do carro e disparou no pé do cachorro. Marley correu e o homem disparou mais duas vezes e o matou. Na segunda, uma jovem foi abordada por três homens e teve uma suástica cravada na barriga com um canivete por estar usando uma camiseta com os dizeres #EleNão. Segundo o delegado, porém, os agressores desenharam um "símbolo budista". No mesmo dia, Anielle Franco, irmã de Marielle Franco, vereadora do PSOL assassinada em março deste ano, sofreu agressões verbais por homens usando a camiseta do candidato. Ela carregava sua filha de dois anos no colo. Ontem, terça-feira, um funcionário da UFPR foi agredido aos gritos de "aqui é Bolsonaro!" por um grupo de torcedores do Curitiba. Ele usava um boné do MST. Além disso, em duas ocasiões, torcedores de futebol foram gravados gritando "o Bolsonaro vai matar veado". Pelo WhatsApp e Facebook, as denúncias desses ataques estão se multiplicando.


Os ataques, infelizmente, não surpreendem. O candidato do PSL tem postura agressiva e seus apoiadores o imitam. Bolsonaro, por exemplo, deixou sua posição em relação aos homossexuais bem clara ao longo dos anos. Ele já declarou que "agora, homossexual, ninguém gosta, a gente suporta", que se um filho "começa a ficar assim, meio gayzinho, leva um coro e muda de comportamento", que "não gostaria de ter um filho homossexual" e que "prefiro que meu filho morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí". Além disso já disse que "as minorias tem que se calar, se curvar a maioria, acabou". Em outubro, em um ato de campanha em Rio Branco, Acre, berrou em cima de um caminhão de som, segurando um tripé de câmera como se fosse uma arma, que "vamos fuzilar a petralhada aqui do Acre". E foi ovacionado.

Cena do comício em Rio Branco. (Foto: reprodução).



Mesmo depois de uma enxurrada de críticas, disse que não pode se "violentar e virar o 'Jairzinho paz e amor'". Questionado por um repórter sobre como ele via esses atos de violência "em nome ou em apoio ao senhor", Bolsonaro entrou na defensiva, e primeiro disse que a vítima foi ele, que ele que levou a facada. Depois, disse que "um cara lá que tem uma camisa minha comete um excesso, que que eu tenho a ver com isso?". Continuou: "eu lamento, peço ao pessoal que não pratique isso, mas eu não tenho controle sobre milhões e milhões de pessoas que me apoiam". Terminou a resposta dizendo que "a violência vem do outro lado, a intolerância vem do outro lado" e minimizou a onda de violência falando que "tá feia a disputa, mas são casos isolados que a gente lamenta e espera que não ocorra".



A grande proposta de segurança pública do candidato é o armamento da população. Segundo ele, "o cidadão armado é a primeira linha de defesa de um país". Essa sua mentalidade que insinua a "justiça com as próprias mãos", na minha opinião, é exatamente o que está dando combustível para esses ataques. Cada um deve se defender contra aquilo que parece o ameaçar. Não importa se é uma pessoa LGBT, um "esquerdista" ou um animal. O desprezo do candidato pelos direitos humanos é outro fator. Afinal, já que não há direitos humanos universais, caberia a cada um decidir quais humanos possuem direitos e quais não possuem.

Por fim, na mesma linha de pensamento de que há espaço para a justiça com as próprias mãos, o candidato, na rádio Jovem Pan, uma vez declarou que "naquela região onde a milícia é paga, não tem violência" e defendeu as milícias em outras ocasiões. Seu filho, em 2007, falava até na legalização das milícias. O candidato voltou atrás depois, mas sem condenar as milícias como um todo - para ele, elas "acabaram se desvirtuando". Ele também foi o único candidato a presidência que não deu declarações imediatamente após o assassinato de Marielle Franco, uma parlamentar do PSOL com atuação incisiva na área de direitos humanos e que participou da CPI das Milícias. Preferiu se calar "para não politizar o assunto", porém seus filhos não tiveram problemas em fazê-lo. Os principais suspeitos do crime são milicianos.

Se ainda como candidato, já há grupos de apoiadores que se sentem a vontade para intimidar, ameaçar e agredir pessoas nas ruas, o que acontecerá se ele for eleito? Vamos lembrar, aqui neste artigo mostrei que o ódio dos apoiadores pode se dirigir a uma pessoa LGBT, a um simpatizante do PT, a uma mulher com sua filha e até a um cachorro. Não tem muito critério. Será que veremos grupos de mascarados - ou até sem máscaras - andando nas ruas com as camisetas do candidato, espancando até quem "olhar torto" pra eles?

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