11/01/2020

O império ataca novamente

Em 3 de janeiro de 2020, o presidente dos EUA, Donald Trump, ordenou o assassinato do Major-General Qasem Soleimani, comandante das forças de elite do Irã e considerado a segunda pessoa mais poderosa do país, e do vice-Comandante da Força de Mobilização Popular do Iraque, Abu Mahdi al-Muhandis, além do motorista deles e um adido militar. Eles foram mortos por um míssil de alta precisão que os atingiu quando estavam se deslocando de carro dentro do Aeroporto Internacional de Bagdá, na capital do Iraque. Os EUA, como sempre fazem após um claríssimo ato de agressão, cinicamente alegaram autodefesa. Segundo eles, Soleimani atualmente planejava ataques à forças dos EUA na região, além de ter sido "responsável" pela morte de militares estadunidenses no Iraque nos anos de 2007-08 e de um segurança privado num ataque com foguetes no final de dezembro do ano passado. Os EUA ocupam dois vizinhos do Irã (Afeganistão e Iraque) há mais de 15 anos e a Síria há cerca de 5, e Soleimani ajudava a resistência armada contra os EUA dentro desses países. Em linha com a estratégia de contenção, as Forças Armadas dos EUA também possuem bases ou alianças militares em outros oito países, como se vê no mapa abaixo.

Os EUA estão em pé de guerra contra o Irã desde que o ditador sanguinário Mohammad Reza Shah foi deposto na Revolução Iraniana de 1979, que instaurou o modelo de governo atual, liderado pelos aiatolás. Em 1980, quando o Iraque de Saddam Hussein atacou o Irã e tomou a região do rio Xatalárabe, os EUA prontamente se alinharam com o Iraque, e mesmo após o uso de armas químicas pelo Iraque, não se afastou dessa aliança. Nessa longa guerra de oito anos, morreram centenas de milhares de iranianos e iraquianos e foi nela que Qasem Soleimani começou a subir postos na hierarquia do exército iraniano.

Mais recentemente, após uma breve trégua no final do governo Obama, com o Acordo Nuclear, os EUA voltaram a impor inúmeras sanções econômicas contra os iranianos. As sanções são uma forma de guerra que atinge muito mais a população civil que o governo ou as forças militares do país que é alvo delas. No Iraque, estima-se que as sanções impostas na década de 90 mataram 500 mil crianças de doenças preveníveis e de desnutrição, já que sob elas, o país não podia importar comida, vacinas e remédios essenciais. Na Venezuela, um estudo recente estimou que 40 mil pessoas morreram por conta das sanções, que impediram a importação de remédios e equipamentos médicos. E no Irã, as novas sanções do governo Trump fizeram o desemprego e a inflação dispararem, além de causar uma recessão. O Fundo Monetário Internacional espera que o país, que cresceu 12% em 2016, deva sofrer uma contração de 6% em 2019.

Os comandantes militares mortos, Qasem Souleimani (à esq.) e Abu Mahdi al-Muhandis (à dir.). Ambos são considerados heróis em regiões da Síria e do Iraque por terem derrotado o Estado Islâmico. (Imagens: Wikimedia Commons).
 
No final do ano passado, já com o país sofrendo sob os efeitos econômicos das sanções, milhares de manifestantes tomaram as ruas do Irã, atacando prédios da administração pública e até exigindo a queda do regime dos aiatolás. Os EUA, obviamente, celebraram as manifestações e demostraram todo seu apoio pela mudança de regime. Porém, o movimento foi perdendo força e não chegou a ser uma ameaça real ao governo iraniano. Alguns chegaram a dizer que o assassinato de Soleimani também enfraqueceria o governo, mas o exato oposto aconteceu. Mais de um milhão de pessoas foram ao velório do Major-General, num claríssimo apoio a linha de atuação dele - ou seja, de combate aos EUA. Como é de praxe nessas situações, muitas bandeiras estadunidenses foram queimadas e se ouviram os cantos de "morte aos EUA".

Então, ficam as perguntas: será que esse ato de "autodefesa" deixou o mundo mais seguro? Ou será que esse assassinato é mais um motivo para milhares de iranianos, iraquianos e outros cidadãos do Oriente Médio se radicalizarem contra esse agressor que vem há décadas ocupando, bombardeando e desestabilizando a região? Será que o objetivo dos EUA é a paz, ou será que é deixar a região em chamas, instável e em eterno estado de guerra, para justificar sua própria presença militar lá?

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Para saber mais:

Sobre o golpe de 1953 que instaurou a ditadura sanguinária de Moahammad Reza Shah, apoiado pelos EUA: "Golpe de Estado x Revolução Popular".

Sobre a política de mudança de regime: "Mudanças de Regime 'do Bem'".
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